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Em 1967, teve início em Juazeiro do Norte, uma das mais arrojadas obras da época. No topo da coluna do horto, junto ao casarão de veraneio do Padre Cícero e sobre o local onde um dia estiveram as ruínas da igreja do Sagrado Coração de Jesus, começou-se a abertura das bases para um monumento de importância imensurável. A localidade onde a estátua foi construída sempre teve grande significado para a cidade, além da igreja fruto da promessa do Padre Cícero, que foi demolida na década de 1940, a colina também possuía um pé de Tamboril que era avistado na parte baixa da urbe, e que tinha sob sua sombra, pequenas taperas e capelas, dentre elas a capela do Beato Elias. Durante a instalação da antena de transmissão de televisão em Juazeiro do Norte, em 1965, o Tamboril foi abaixo, assim como também as últimas ruínas da velha igreja, dando lugar a antena de transmissão de televisão. Dois anos depois, durante a preparação das obras para a estátua, mais intervenções foram feitas na velha colina, que conservou naquele trecho somente o casarão do Padre Cícero, esse também bastante desconfigurado atualmente.

A gestação do projeto se deu pela provocação feita por um beato, ao então prefeito de Juazeiro do Norte, Mauro Sampaio. Decidido a fazer a estátua, Dr. Mauro contou com o talento do representante comercial da Cinzano, a época uma afamada indústria de bebidas, Armando Mardsen Lacerda. Pernambucano do Recife, Armando era filho de Agripino Carneiro de Lacerda e Martha Marsden Botelho. Ainda na infância deu provas de seu talento artístico, esculpindo figuras mitológicas usando cera de abelha. Armando foi aluno da Escola de Belas Artes de Pernambuco, e aos 23 anos preparou sua primeira escultura para exposição. Nomeada “O Pensador”, ela foi apresentada ao público durante o Salão de Arte Moderna do Recife.

Armando fez em gesso uma estátua de 1,20m, que serviu como base para os cálculos necessários para execução da obra. Elaborado do pelo barbalhense, Raymundo Rômulo Ayres Montenegro, o projeto estrutural da estátua foi desafiador. Raymundo projetou o monumento para suportar ventos de até 180km/h, mas para chegar aos dados de velocidade do vento na colina do Horto, contou com a ajuda dos aviadores da Igreja Batista de Juazeiro do Norte, que sobrevoaram o local com o Piper da congregação, e conseguiram dados que permitiram mensurar a velocidade média.

Optou-se no período, pela montagem da estátua em blocos, que foram construídos paulatinamente em um antigo depósito de algodão na Rua São Francisco, esquina com São Paulo. As peças eram confeccionadas e transportadas até o Horto, onde recebiam os arremates finais, e por meio de roldanas iam sendo colocadas junto a estrutura em concreto que preenche o interior do monumento, como pode ser visto no vídeo ao final do artigo.

Dr. Mauro Sampaio no barracão da Rua São Francisco

Um dos grandes impasses que Dr. Mauro encontrou foi a ausência de cimento. Para solucionar o problema, recorreu a Plácido Aderaldo Castelo, antigo juiz da comarca de Juazeiro do Norte, e que naquele período ocupava o cargo de governador do estado do Ceará. Dr. Plácido havia iniciado o processo de construção do Castelão, e diante da grande demanda por concreto, havia aberto um canal de importação de cimento europeu, o que ajudou a sanar também a falta do material na construção da estátua.

A equipe escolhida por Dr. Mauro era deveras competente. Raymundo Rômulo, em 1959 ingressou no curso de engenharia civil da Escola de Engenharia da Universidade Federal de Pernambuco, concluindo em 1963. Na mesma instituição, especializou-se em transportes e estruturas especiais, tendo também cursado módulos de projeto de abastecimento de água, administração de serviços de água e de esgoto sanitário, na Universidade de São Paulo (USP).

Em 1963, passou a integrar os quadros da CAENE (Companhia de Água e Esgoto do Nordeste), tendo sido responsável pelo escritório regional de Juazeiro do Norte, que abrangia o sul do Ceará, e algumas regiões do Pernambuco e Piauí, executando operações de abastecimento que possibilitaram mais de 8.000 ligações de água. Simultaneamente executava obras e projetos, tendo como pessoa física realizado a construção da IESA (Indústria de Eletromáquinas S/A), Cariri Industrial de Óleos S/A, dentre outras.

Em 1966, fundou a EMPREC (Empreendimentos de Engenharia Civil LTDA), construtora responsável por obras em vários estados, a destacar o Ceará, Distrito Federal e São Paulo. No Cariri, a empresa foi responsável por edificações importantes, como o Edifício Arnóbio Bacelar Caneca, sede do BNB em Juazeiro do Norte; SESI do Crato e Juazeiro do Norte; Estádio Mirandão, em Crato; Usina Manoel Costa Filho, em Barbalha, e o Memorial Padre Cícero, em Juazeiro do Norte. Atualmente, aos 83 anos, Raymundo segue ativo e tocando seus empreendimentos junto aos filhos. Armando Marsden Lacerda faleceu em 09 de novembro de 1980, ainda esculpindo, e residindo em Timbaúba, no estado do Pernambuco. Seu falecimento foi registrado pelos principais periódicos do país, que o homenagearam e exaltaram seu longo legado artístico.

A estátua em 1971 – FONTE: Revista Manchete

O resultado não poderia ser outro. O monumento foi inaugurado em 01 de novembro de 1969, e devido a pouca infraestrutura do local onde ele estava situado, a cerimônia de inauguração ocorreu na parte baixa da cidade, reunindo entre 100 e 200 mil pessoas, e recebe anualmente mais de dois milhões de visitante, permanecendo integro, prova da competência dos responsáveis.

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Acadêmico de História na Universidade Regional do Cariri (URCA), foi secretário geral do Instituto Cultural do Cariri (ICC) e conselheiro de cultura do Crato. Fundou o Cariri das Antigas em 2014, e desenvolve pesquisas na área de História Política e Social. Atuou como bolsista da FUNCAP no projeto "Biopoder, Saúde e Saber médico: O Hospital Manuel de Abreu e as práticas de cura e controle da tuberculose na Região do Cariri nos anos de 1970”, coordenado pelo Prof. Dr. Francisco Egberto Melo. É diretor administrativo do Clube do Automóvel do Cariri - Siqueira Campos, sendo o historiador responsável pela edição do periódico do clube, fruto de suas pesquisas acerca da história do automóvel no Brasil, com recorte entre as décadas de 1890 e 1990. Tem como pesquisa de trabalho de conclusão de curso, a História e Desenvolvimento da Aviação no Cariri, com enfoque principal na atuação do Correio Aéreo Militar.