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Seguindo pela rodovia que cruza o Barro, uma estrada de terra nos conduz para o epicentro dos antigos domínios do Major José Inácio, homem destemido, afiado construtor de relações políticas e bélicas, e um dos nomes de maior expressão no Cariri Cearense durante a República Velha. Após poucas centenas de metros, é possível avistar os casarões que um dia abrigaram o mandão daquelas terras, protagonista em boa parte das obras sobre a região.

Acompanhado de Bruno Yacub e Sousa Neto, secretário de cultura da cidade, e nosso guia pelas histórias do Barro, fizemos breve visita aos imóveis do major, e rumamos em viagem incontinenti até a Fazenda Timbaúba. Após longo trajeto em caminhos poeirentos, chegamos a um trecho mais largo da estrada, que nos contemplou com um pôr do sol indescritível, uma frondosa árvore e uma casa alpendrada, de aspecto simples, mas ainda assim imponente.

Vista frontal do imóvel.

Não fosse pela placa afixada pela gestão municipal, poucos saberiam o significado histórico daquele imóvel. Ali, entre meados de 1916 e 1921, foi proprietário do imóvel, Sebastião Pereira e Silva, mais conhecido como Sinhô Pereira, um dos mais famosos personagens da história do cangaço.

Homem valente, estrategista e vingativo, Sinhô Pereira ingressou no cangaço nos primeiros anos do Séc. XX. Descendente do Barão do Pajeú, Sebastião teve participação proeminente no conflito sangrento entre sua família, e os Carvalho. Mesmo vindo de berço abastado, Sinhô Pereira tinha os atributos necessários para galgar espaço no cangaço, e em pouco tempo sua fama se espalhou pelo Nordeste.

Com fortes vínculos ao Major Zé Inácio, Sinhô se sentiu confortável em estabelecer um ponto de apoio nos domínios do chefete. A casa tratada neste artigo traz em sua disposição interna, as marcas da vida cangaceira. Seu interior possui, além da sala e cozinha, pequenos habitáculos, que serviam aos membros do bando do afamado cangaceiro.

Sousa Neto nos explica que diante da impossibilidade de recorrer a outros meios de guarda dos seus bens, os cangaceiros levavam consigo boa parte de seus bens, e principalmente dinheiro. A possibilidade de um furto praticado durante a noite, tornava incomoda a ideia de compartilhar quartos ou camarinhas, e diante disso, a divisão interna do imóvel foi feita de modo que permitia aos membros do bando, uma noite de sono mais tranquila.

Sinhô Pereira – 1960´s.

Em 1920, um jovem aparentado de Sinhô passou a integrar seu bando, e em muitas oportunidades descansou e conviveu com seus companheiros de crimes sob aquele teto. Seu nome era Virgulino Ferreira da Silva, e àquela altura, com apenas 23 anos, já tinha dado mostras de suas capacidades. Alguns anos depois, mais velho e experiente, se tornaria o mais temido e procurado cangaceiro da história, Lampião – “O Rei do Cangaço”.

Lampião ainda jovem.

Atualmente o imóvel se encontra desabitado, entretanto, medidas são tomadas para estabilizá-lo. Como se trata de uma construção feita com tijolos de adobe e barro com cal, ela se torna deveras suscetível ao desgaste pelas intempéries do tempo, principalmente a chuva.

O registro desse imóvel mostra as potencialidades históricas e turísticas do Barro. Agradeço a Sousa Neto pela recepção e disponibilidade de sempre, e também a Bruno Yacub, companheiro de pesquisas incansável, sempre presente nas expedições que organizo por esse vale encantador.

ABAIXO, CONFIRA MAIS FOTOS DO IMÓVEL:

Sousa Neto apresenta a sala principal.
Aspecto da divisão dos cômodos. As meias paredes permitiam melhor circulação de ar entre as partes do imóvel.
Parte de trás do imóvel, onde é possível notar elementos construtivos, e resquícios de um cômodo que desabou.
Da esquerda para a direita: Eu, Sousa Neto e Bruno Yacub.
Alpendre do imóvel.

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Roberto Junior
Acadêmico de História na Universidade Regional do Cariri (URCA), foi secretário geral do Instituto Cultural do Cariri (ICC) e conselheiro de cultura do Crato. Fundou o Cariri das Antigas em 2014, e desenvolve pesquisas na área de História Política e Social. Atuou como bolsista da FUNCAP no projeto "Biopoder, Saúde e Saber médico: O Hospital Manuel de Abreu e as práticas de cura e controle da tuberculose na Região do Cariri nos anos de 1970”, coordenado pelo Prof. Dr. Francisco Egberto Melo. É diretor administrativo do Clube do Automóvel do Cariri - Siqueira Campos, sendo o historiador responsável pela edição do periódico do clube, fruto de suas pesquisas acerca da história do automóvel no Brasil, com recorte entre as décadas de 1890 e 1990. Tem como pesquisa de trabalho de conclusão de curso, a História e Desenvolvimento da Aviação no Cariri, com enfoque principal na atuação do Correio Aéreo Militar.