Em junho de 1911, a chegada de um visitante ilustre movimentou a cidade do Padre Cícero. Augusto Santa Cruz, bacharel em direito, homem de fino trato e sobrenome importante, marchava pelas ruas de Joaseiro depois de uma longa e castigante fuga. Após deflagrar um movimento armado em Alagoa do Monteiro (atual Monteiro), na Paraíba, Santa Cruz se viu encurralado pelas forças legalistas, e optou por fazer reféns importantes, e tomar as estradas e varedas que ligavam aquele estado ao Cariri.
Destemidos e fortemente armados, assim como o seu chefe, o pequeno exército de Santa Cruz deixou de mãos atadas as autoridades judiciárias das cidades por onde marcharam. Com a chancela do presidente do estado do Ceará, o bacharel encontrou em Joaseiro seu ponto de parada. A visita causou tensão, tendo em vista o contexto político delicado que a cidade vivenciava. Entretanto, o Padre Cícero tinha outra opinião, enxergando a possibilidade de apaziguar o conflito.
Em conferência no casarão da R. São José, onde hoje é sediado o abrigo de idosos, Santa Cruz recebeu conselhos do religioso, e as condições para sua permanência, a destacar o degredo para a Serra do Araripe e suas roças de mandioca, ao qual seriam submetidos os cabras mais perigosos e voláteis, e a deposição absoluta das armas. Sem muitas opções, o chefete concordou e convocou seus homens, que aguardavam nas escadarias da matriz de Nossa Senhora das Dores.
Em fila, cada um deles se apresentou ao padre, entregando seus armamentos e recebendo conselhos para largar as pelejas bélicas. Naquela ocasião, uma situação eternizou-se na memória dos presentes. Após todos se apresentarem, o Padre Cícero lançou um olhar severo para os homens, e falando grosso, deu a sentença:
– Está faltando uma arma, ande cabra, bote ela aqui!
Horácio Patriota, procedente da região de São José do Egito, e agora membro do exército de Santa Cruz, deu um passo a frente, sentindo uma mescla de vergonha e surpresa. Debaixo das grossas vestes, retirou uma pequena pistola, que havia guardado como precaução ao saber do recolhimento do armamento, e a depositou aos pés do padre, sem entender como aquele idoso, de olhar vivo e penetrante, havia descoberto sua artimanha.
REFERÊNCIAS
Padre Cicero: Poder, fé e guerra no sertão – Lira Neto (compre clicando aqui: https://amzn.to/2SzPsJM )
Guerreiro togado: fatos históricos de Alagoa do Monteiro – Pedro Nunes
Padre Cícero: Anjo ou Demônio? – Teias de noticias e ressignificações do acontecimento padre Cícero (1870-1915) – Maria de Fátima Morais Pinho – Faça o download clicando aqui